No interior do nordeste existia uma pequena cidade, de poucos habitantes de nome Pilares. Cidadezinha simples. Apenas uma rua a cortava ao meio.Seu povo vivia do campo, quase um comércio de troca. Tinha uma única venda que era uma mistura de bar, mercado, farmácia, correio, pensão, um lugar de encomendas e recados. Tudo girava em torno da venda de Seu Luiz Braz, um senhor de 70 anos e que a vida toda esteve ali.O estabelecimento era um galpão grande com um balcão comprido, algumas mesas, bancos e redes. De necessário tudo tinha, pelo menos para aquele povo. Nos finais de tarde muitos ficavam por ali proseando e tomando uma pinga ou sentados na calçada da venda que era mais alta que a estrada e onde as pernas ficavam balançando. Olhavam a rua onde crianças brincavam, passavam cavalos e seus cavaleiros, algumas bicicletas e raríssimos carros. Estes, só de viajantes, que iam levantando a poeira até o final da visão. Aos domingos era festa. A pequena igreja de Santa Cecília,do outro lado da rua, que durante a semana virava escola, ficava cheia, O padre vinha de fora, a missa era as onze horas e muitos já vinham almoçados. Depois ficavam todos ali ao redor da venda, o grande ponto de encontro . Era o que se tinha e para eles era o melhor.
Em um 13 de outubro pessoas de fora chegaram ao lugar. Homens do poder. Reuniram o povo e comunicaram de forma definitiva que Pilares seria inundada pelas águas do grande rio. Males do progresso. Todos passariam a viver em uma Nova Pilares construída pelo governo.Da mesma forma que as águas invadiriam, a dor invadiu os corações. A saída foi acompanhada de uma aflição e de um sentimento de perda inestimável. Aquele pedaço de chão seco que os acolhia tão bem, não iria mais existir . E as águas vieram inundando, arrastando, levando o que podia e muito mais .Ninguém voltou lá para ver como ficou, ninguém teve coragem.
Em Nova Pilares, Seu Braz continuou com seu comércio, mas agora bem menor. Lá, o banco era junto ao correio, tinha uma farmácia de verdade, posto de saúde, a igrejinha ficou maior e o padre morava nela. A escola nova tinha até quadra de esporte. A Nova Pilares era nova , mas não era ela. Anos se passaram e aconteceu o que foi para muitos um milagre. Com o novo desvio das águas, Pilares sairia debaixo do grande rio. Mesmo sabendo que ninguém mais poderia voltar a viver lá, uma mistura de alegria, saudade tomou conta daquela gente. Os corações se encheram de um sentimento que não podiam explicar. O tempo passou e a água secou. Aos poucos um e outro ia até lá para ver o que restou . Seu Braz não pode voltar, o seu tempo foi menor do que a saída das águas. A antiga professora, casou-se com um militar e foi embora para capital, as crianças cresceram e as lembranças diminuíram. Hoje, aos domingos, alguns se reúnem no que restou da antiga calçada da venda de onde não mais se balançam as pernas e ficam ali remoendo as lembranças e olhando para o que era a antiga rua, onde nada passará, nada além do passado.
Ismélia Rodrigues Monteiro
Ismélia Rodrigues Monteiro
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